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Publicada em: 02/10/2010 07:08 - Atualizada em: 03/04/2014 10:49
Entrevista: era uma dupla; hoje moram em Lavras; o filme ganhou um Oscar
Diter Stein entrevistou Amaury Cassiano e tenente Aurino Cassiano, a Dupla Chuvisco; eles participaram de filmes com Jô Soares, Grande Otelo, Ankito, Renata Fronzi, Zezé Macedo, Colé, Zé do Caixão. Cantaram com Luiz Gonzaga, Jair Rodrigues, Ronie Von e outros.

     

        Amaury Cassiano, Aurino Cassiano e seu neto, Lucas Cassiano

 

Hoje os dois moram em Lavras. Amaury Cassiano, 65 anos, é professor e dono de uma academia de música, "O Mundo Musical". O tenente Aurino Cassiano, 63 anos, é aposentado da Polícia Militar de Minas Gerais. Eram conhecidos como a Dupla Chuvisco, participaram de filmes com Jô Soares, Grande Otelo, Ankito, Renata Fronzi, Zezé Macedo, Colé, Zé do Caixão. Cantaram com Luiz Gonzaga, Jair Rodrigues, Ronie Von e outros.

Mas o auge da carreira foi quando Aurino participou, como protagonista, do filme "Orfeu Negro" do diretor francês Marcel Camus. Fazia o personagem principal quando criança.

Para quem não conhece a história, Orfeu Negro foi escrito por Vinicius de Moraes; as músicas por Tom Jobim. É uma adaptação em forma de musical do mito grego de Orfeu transposto para a realidade das favelas cariocas da época. O espetáculo estreou no Teatro Municipal do Rio de Janeiro em 25 de setembro de 1956, com cenários de Oscar Niemeyer.

O filme, uma produção ítalo-francesa, foi realizado em 1959 e foi um grande sucesso mundial. No mesmo ano ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro e a Palma de Ouro como melhor filme do Festival de Cannes. Mas o mais importante foi a divulgação da música brasileira que o filme fez. Foi com o filme Orfeu Negro que o mundo tomou conhecimento da bossa nova. Hoje Orfeu Negro é um clássico do cinema mundial.

Amaury e Aurino, apesar de curtirem seu passado, falam com bastante simplicidade sobre sua história. Mas quando Aurino senta-se na bateria e Amaury pega na guitarra, e os dois acompanham Lucas Cassiano, de 12  anos, no vocal, os olhos deles brilham. Parecem  garotos se divertindo com o talento do neto de Aurino. Como se o menino Lucas Cassiano fosse dar continuidade a história deles. Talento para isso o Lucas tem.

 

Jornal de Lavras: Que coincidência o Amaury ser avô da Tahiane e Rahiane, amigas de minhas filhas Bianca e Babi. Mas vamos à vida de vocês... como foi o começo?

Aurino: Éramos 11 irmãos. A gente morava em Natal, no Rio Grande do Norte. Meu pai tinha uma venda...

Amaury: (interrompe).... a gente tinha um irmão, o Nilton Cassiano, que sabia cantar e tocar violão. Ele deu as primeiras aulas. Eu aprendi um pouquinho de violão. Fizemos um pandeiro com uma lata de goiabada e o Aurino aprendeu nele. Aí comecei com cavaquinho. Eu no cavaquinho e o Aurino no pandeiro.

 

Jornal de Lavras: E como vocês vieram para o Rio de Janeiro?

Aurino: Nosso irmão Miguel veio na frente; ele estava trabalhando de motorista na Kibon. Tinha mais ou menos uns 6 anos e o Amaury 8 anos. A gente veio de navio. A família toda. Me lembro até hoje da farra que foi a viagem...

Amaury: ... a gente chegou no Rio de Janeiro fomos morar em Engenho de Dentro, e em pouco tempo eu e o Aurino estávamos tocando junto nas ruas. A gente tocava na Praça 15, na Praça Mauá na Central do Brasil e até na Lapa. A gente não cantava, só tocava e fazia malabarismos com os instrumentos, brincava com o público, e assim a gente ganhava sempre um trocado.

 

Jornal de Lavras: Meio como no filme "Os dois filhos de Francisco e a história de Zezé di Camargo e Luciano?

Amaury e Aurino: Mais ou menos... era outra época. Mas o nosso dinheiro ajudava muito em casa. Era a gente e o nosso pai que sustentavam a casa.

 

Jornal de Lavras: Não era perigoso duas crianças na rua até de noite? Não saía briga?

Amaury e Aurino: Ihh... era super tranqüilo. O Rio de Janeiro naquela época era uma beleza. Não tinha violência, e o carioca era muito alegre, todo mundo brincava com todo mundo. O Rio era uma cidade alegre, e a droga quase não existia. Tinha só bebida e às vezes lança-perfume. Mas mesmo assim, uma irmã mais velha ia com a gente e ficava até a gente voltar. Quando a gente via que o ponto estava ocupado, procurava outro lugar, tinha espaço para todo mundo. Nunca vimos uma briga.

 

Jornal de Lavras: E o sucesso, como veio?

Aurino: A Praça Mauá e a Praça 15 era passagem do pessoal da Radio Mayrink Veiga. Passavam lá artistas e o pessoal das rádios. Um dia passou lá um empresário chamado Vovô Odilon. Ele viu a gente tocando na rua e gostou. Botou o nome na gente de Dupla Chuvisco e nos levou pra tocar em circos, nos programas de rádio etc. Ele tinha vários artistas contratados e um deles que a gente conheceu era a Wanderléia, que devia ter uns 13 anos e depois estourou na Jovem Guarda. Tempos depois encontrei ela aqui em Lavras, quando veio fazer um show.

 

Jornal de Lavras: O que vocês tocavam?

Amaury: Muita coisa, mas sempre Brasileirinho, de Waldir Azevedo, e Tico-tico no Fubá, de Zequinha de Abreu, com malabarismo e algum sapateado

Aurino: ...mas aí em 1957 alguém viu a gente e nos convidou pra fazer um filme, o "Pega Ladrão". O filme mesmo não deu muito dinheiro. Mas divulgou nosso nome. Me lembro quando a gente estava assistindo o filme em Nova Iguaçu, onde passamos a morar, e acenderam as luzes do cinema, todo mundo ficou apontando pra gente.

 

Jornal de Lavras: E depois?

Aurino: Aproveitamos a divulgação e passamos a ganhar mais nos shows nos circos e nas ruas. Aí então, em 1960, veio outro filme, "Vai que é Mole". Este fez mais sucesso. Era uma comédia da Hebert Richards, dirigido pelo J.B. Tanko e tinha O Ankito e o Grande Otelo, que eram grande sucesso na época, além do Jô Soares, a Renata Fronzi, o Otelo Zeloni e o Carlos Imperial, que depois se ligou ao Roberto Carlos, Erasmo Carlos e o pessoal da Jovem Guarda.

Amaury: ...eu não participei, mas acompanhei o Aurino; a gente ficou morando nos estúdios da Herbert Richards enquanto o Aurino estava filmando.

 

Jornal de Lavras: Como era conviver com grandes astros da época como o Ankito, Grande Otelo, Jô Soares etc?

Aurino: Eles eram muito simples e muito amigos. Enquanto a gente esperava a filmagem, o Grande Otelo e o Jô Soares ficavam jogando bola de gude com a gente. Era muito divertido. A gente vivia na maior mordomia. O grande Otelo gostou muito de mim, tentou inclusive me adotar, mas meu pai não quis.

Amaury: ... o filme fez um bom sucesso e passamos a ganhar mais nas ruas e no circo. Era alí que a gente tirava a maior parte de nosso ganho.

 

Jornal de Lavras:  O Marcel Camus do Orfeu Negro chegou até vocês de que maneira?

Amaury: Ele estava no Brasil preparando as filmagens do Orfeu. Ele viu as filmagens do "Vai que é mole" na Avenida Rio Branco, e nos chamou para um teste. Mas só o Aurino passou; eu fiquei pela idade e tamanho.

Aurino: Fiz o Orfeu quando era novo; o Breno Mello, que era jogador do fluminense e depois se tornou ator, fez o Orfeu adulto. Pena que ele teve uma vida muito sofrida no final... Acabei fazendo o personagem principal do filme, quando ele era criança. O filme foi uma super produção. Levaram a gente e nos hospedaram no Hotel Glória. Ficamos boquiabertos. O Hotel Glória era um dos hotéis mais chiques do Rio naquela época. Como era julho e o filme se passava no carnaval, contrataram escolas de samba. O Breno tinha que tocar violão e não sabia; o Amaury acabou ensinando a ele como fazia. Depois o filme estourou e foi um sucesso mundial, ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro e palma de ouro do Festival de Cannes.

 

Jornal de Lavras: E depois do Orfeu Negro?

Aurino: A gente foi pra São Paulo. De novo tocando em praças e circos. O Zé do Caixão nos viu e nos contratou para o filme que ele estava fazendo, "Meu destino em suas Mãos", que foi o filme que fez o sucesso do Zé do Caixão. Depois nos convidaram para tocar no Programa da TV Tupi, "Almoço com as Estrelas". Lá tocamos com Luiz Gonzaga, Jair Rodrigues, Ronie Von e muitos artistas conhecidos da época. Até que com o rock, a música brasileira começou a perder espaço e a gente começou a sentir dificuldades.

 

Jornal de Lavras: Porque vocês vieram para Lavras?

Aurino: De novo um irmão... um irmão meu chamado Waldemar tinha uma loja na Galeria Curi, na Rua Francisco Salles. Vim passar uns dias e me apaixonei pela cidade. Adorei Lavras. Resolvi ficar,  soube que estavam abrindo inscrições para a Polícia Militar e me inscrevi. Na época um oficial, ao ver minha ficha e minha roupa - eu estava com uma calça boca de sino, sapato e camisa toda diferente - me perguntou se tinha certeza de que gostaria de ser policial. Explicou que talvez um artista tivesse dificuldades com a disciplina. Foi uma das melhores coisas que fiz na vida. A disciplina militar me ajudou muito a organizar minha vida particular e profissional. Me proporcionou uma vida estável. Voltei a estudar, depois fiz direito e com curso superior fiz o curso de oficial. É uma organização que tenho orgulho de fazer parte. E ainda pude participar com a música: toquei guitarra, contrabaixo e depois ritmo na banda da PM.

 

Jornal de Lavras: E o Amaury?

Amaury: Eu sempre fui apaixonado por música. Minha vida sempre foi a música. Acompanhei cantores como Lindomar Castilho, Sérgio Reis, Roberto Leal. Depois comecei a trabalhar como vendedor e então pude estudar música.

Estudei música profundamente, fiz conservatório e depois pós graduação. Estudei nove anos. Seis anos de piano; e toco por prazer uns 30 instrumentos. Montei em São Paulo uma escola de música e há poucos anos vim também para Lavras.

Vim morar em Lavras e montei a escola de música Mundo Musical, aqui ao lado da Radio Clube.

 

Jornal de Lavras: E o Lucas, como descobriram o talento dele?

Aurino: O nome dele é Lucas Cassiano Bisso Alonso, é meu neto. Um dia, quando ele tinha 6 anos, e eu estava cantando, percebi que ele estava me acompanhando. Me chamou atenção como ele estava no ritmo e como era afinado. Coisa dele mesmo. Percebi que ele tinha uma coisa nata e comecei a me interessar. A gente começou a desenvolver o seu talento. Hoje ele está com 12 anos e está pronto. Na minha opinião, se tudo der certo pode vir a ser um grande sucesso. A gente está compondo umas músicas para ele e acreditamos na estrela dele.

Amaury: Pra encerrar, gostaria de falar do nosso CD. Em 2005 gravamos um disco de música Gospel. O Aurino é muito cuidadoso e apesar de ter um certo conhecimento, é católico, foi Ministro Extraordinário da Eucaristia durante 3 anos, na Igreja Matriz de Santana, mas para não falar bobagem nas suas composições estudou três anos de teologia. Foi um CD que eu fiz as músicas e o Aurino as letras. Gravamos o CD e distribuímos aos amigos.

 

Diter Stein

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